quinta-feira, 21 de novembro de 2024

Povoado-fantasma no entorno de Jericoacoara pode ser usado para explicar confusão por terras de Vila


Junco é o nome que se dá a uma espécie de planta gramínea frequente em locais úmidos. É também o nome de uma antiga comunidade de Jijoca de Jericoacoara, no Litoral Norte do Ceará, situada numa área-chave para tentar compreender a disputa judicial de terras relacionadas à Vila de Jericoacoara, que veio a público em outubro deste ano. O problema é que Junco não existe mais: tornou-se um “povoado-fantasma” há mais de 20 anos.

O Junco ganha importância na discussão porque fica numa área localizada no limite sul do Parque Nacional de Jericoacoara. De um lado, antigos moradores dizem que ele marca o fim da fazenda do ex-esposo de Iracema Correia São Tiago. Do outro, a defesa da empresária garante que o povoado faz sim parte das terras pertencentes a ela, que se estendem até o litoral e cobrem boa parte da Vila.

A comunidade era composta por 11 casas, segundo Francisco Teixeira, de 69 anos, que comprou um lote por lá em 2001. Conhecido como “Dachaga”, ele batizou a propriedade de “Juncolândia” e promoveu uma série de melhorias, construindo instalações para criação de animais e uma caixa d’água para irrigação da agricultura.

O Junco tinha moradias, poço, escola infantil e até cemitério próprio. Tudo foi abandonado em 2002, após a criação do Parque Nacional (Parna) de Jericoacoara pelo Governo Federal. Mesmo identificada no Plano de Manejo do Parque, a comunidade foi extinta. Até hoje, os moradores não sabem quem mandou derrubar as instalações.

O Diário do Nordeste visitou a localidade, a cerca de 6 km da Vila e 300 km de Fortaleza, acompanhada por nativos e membros do Conselho Comunitário de Jericoacoara.

O Junco, atualmente, é de difícil acesso. Como se passaram mais de 20 anos desde a saída das famílias do local, a trilha de areia esmaeceu e a vegetação, densa e espinhosa, tomou conta dela. Para desbravá-la, foram usados carros de tração 4x4 e objetos para cortar os galhos secos ao longo do caminho.

Acompanhando o grupo, estava Luís Zeca, 83, que diz ter trabalhado por 12 anos como capataz da fazenda de José Maria Machado - ou “Firma Machado”, como é mais conhecida pelos moradores mais antigos. A pé ou montando um burro, ele fiscalizava uma longa extensão de terra onde se plantava caju, legumes e até algodão.


Contudo, segundo ele e outros moradores, a firma tinha sim um fim antes de chegar à área do Parque. Embrenhado na mata, Dachaga encontrou uma estaca de cimento, popularmente chamada de “mourão”; segundo a memória deles, o objeto demarcava o fim da fazenda. 

Cerca de 20 metros à frente, identificaram outro mourão, de cor diferente e quase soterrado pela areia. Este pertenceria ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), órgão gestor dos parques federais brasileiros. Nenhuma das duas estacas tinha placa ou inscrições indicando quem seria o responsável por ela. Os desbravadores, porém, repetiam que um mourão marca o fim da firma, e o outro indica o início do Parque.

A defesa de Iracema Correia São Tiago, ex-esposa de José Maria e requerente das terras, reitera que as propriedades são devidamente registradas em cartório, respeitando diretrizes e normas legais. "Independentemente da ocupação de quem quer que seja, os limites da fazenda são os mesmos: começa no litoral e termina no córrego (da Forquilha)", ressalta.

"Não é possível saber agora, tantos anos depois, se essas famílias citadas na matéria tinham autorização do sr. José Maria ou do administrador da fazenda, Antônio Tavares, para residir no local ou se essas famílias invadiram a área. A existência de eventuais moradores em algum ponto da propriedade não invalida os limites de onde ela começa e nem de onde ela termina. Apenas demonstra que existia uma relação cordial entre o sr. José Maria de Morais Machado com moradores da região", informou à reportagem.

Diário do Nordeste

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