Se alguém percorresse o litoral cearense inteiro beirando o mar, avistaria parques eólicos sobre campos de dunas em quase todas as praias da costa. Agora imagine olhar para o oceano e ver também uma coleção de milhares de torres eólicas nas águas, ligadas ao continente através de cabos de transmissão de energia, subestações e outras infraestruturas industriais de grande porte.
Esta pode ser a paisagem que os banhistas verão se forem construídos os parques eólicos offshore – complexos de produção de energia obtida a partir do vento instalados no mar – que estão sendo planejados para o Estado. Essa é uma modalidade de geração de energia que ainda não existe no Brasil, mas já há uma corrida de interessados cadastrando pedidos para a instalação desse tipo de empreendimento em toda a costa brasileira.
Em novembro de 2020, o Ibama lançou um Termo de Referência que orienta o que os empreendedores devem apresentar nos estudos de impacto ambiental para avaliar a viabilidade dos projetos. Até então, menos de 10 projetos desse tipo haviam sido cadastrados no órgão. Após o lançamento do termo, houve um salto.
Há hoje 74 projetos pré-cadastrados na plataforma do Ibama para todo o país, de acordo com o último mapeamento divulgado pelo órgão, em março deste ano. A maior parte está no Ceará e no Rio Grande do Sul (22 pedidos para cada estado). Nenhum deles ainda está licenciado, e a maioria está apenas em fase de pré-cadastro, não tendo nem apresentado os estudos de impacto ambiental ainda.
Mas só a movimentação por parte dos empreendedores, aliado a um grande empenho do governo do Ceará em garantir esses investimentos para o estado, já vem causando preocupação às populações da zona costeira, principalmente às comunidades de pescadores artesanais.
O boom de interesse por essas eólicas – mais do que gerar eletricidade para o consumo em terra – tem a ver com a expectativa de que essa energia renovável possa alimentar a produção do chamado hidrogênio verde (ou H2V), que vem sendo exaltado como “combustível do futuro”.
A ideia é produzir em larga escala uma alternativa limpa aos combustíveis fósseis, voltada principalmente para exportação, em meio aos esforços globais para reduzir a emissão de gases que provocam o aquecimento global.
A implementação dos parques offshore, porém, está envolta em incertezas. Faltam referências e pesquisas sobre impactos de eólicas no mar no hemisfério sul – pelo simples fato de que ainda não existe nenhum empreendimento desses por aqui. Por um lado, isso dificulta a própria análise dos impactos dos empreendimentos; por outro, gera angústia nas comunidades da região.
Calejadas com a rápida expansão de parques eólicos nos últimos anos – em um processo de ocupação de território que foi muitas vezes cercado de violações de direitos –, as populações locais temem que a chegada das offshore repita e amplie os conflitos, atingindo em cheio a pesca artesanal.
Nos últimos dois meses a Agência Pública visitou comunidades na costa do Ceará que podem ser afetadas pelos empreendimentos. Alguns já vêm se organizando para tentar ter voz nesse processo e minimizar os impactos da transição energética. Mas o que mais encontramos foram pessoas aflitas diante do desconhecido.
É esse o caso dos pescadores de Barra das Moitas, praia do município de Amontada, a cerca de 200 km de Fortaleza. A comunidade é um dos locais onde foram feitos os primeiros protocolos de consulta prévia do Ceará, elaborados com a coordenação do Instituto Ecomaretório.
A principal preocupação dos pescadores artesanais se refere a eventuais limitações ao trânsito de embarcações nas proximidades de onde serão instaladas as torres. Pelos projetos já apresentados, elas podem ficar muito próximas à praia e sobrepostas aos locais onde hoje é feita a pesca ou no caminho que os pescadores fazem para chegar até os pontos de pesca.
Em audiência pública realizada em maio na Assembleia Legislativa do Ceará (Alece) para discutir os projetos de parques de energia eólica offshore, uma das críticas foi de descaso com os questionamentos levantados pelas populações atingidas em relação aos impactos socioambientais em seus territórios. Outras pessoas também reclamaram da falta de diálogo do governo do estado com as comunidades.
Veja reportagem completa AQUI!
Com informações da Agência Pública
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