Em Sobral, ônibus do transporte coletivo do município se deslocam pelas principais vias da cidade com luzes instaladas por toda a carroceria do veículo. Enquanto isso, do lado oposto do mapa do Ceará, em Cascavel, peças publicitárias na rede social do prefeito exibem a decoração natalina contratada pela gestão municipal e anunciam a programação do evento organizado na Praça Nossa Senhora do Ó, no Centro.
Os dois exemplos mencionados, apesar de situados em municípios do Ceará, não são episódios isolados, mas medidas adotadas pelo poder público em todo o Brasil. Ao longo de todo o mês de dezembro, shows são promovidos pelas prefeituras, estruturas que reproduzem os tradicionais pinheiros são montadas em locais públicos e outros símbolos relacionados com o imaginário da festa passam a ocupar um espaço privilegiado no cotidiano dos moradores.
Seja para alavancar as vendas do comércio local seja para mobilizar a opinião pública em prol de uma imagem positiva da administração municipal - dando destaque ao Menino Jesus ou ao Papai Noel -, o Natal se torna uma ação estratégica com verniz de política pública e um ativo relevante para o cenário pré-eleitoral que está por vir no próximo ano.
Chefe do Executivo de Juazeiro do Norte, na região do Cariri, Glêdson Bezerra diz que o Natal terá outros contornos, mais diminutos, em razão do contexto financeiro desfavorável, com baixas nos repasses da administração federal e nos tributos que ajudam a compor as receitas municipais.
O intuito da Prefeitura de Juazeiro do Norte, justifica Bezerra, é aproveitar o número significativo de visitantes e ofertar a eles - assim como para o público da região - atrativos que fomentem a movimentação no comércio e aquecer as vendas.
Perguntado sobre a possibilidade da conversão de toda essa movimentação natalina em capital político, ele negou que esse seja o objetivo primário, mas admitiu que isso pode ser um reflexo: "Pode ser consequência. Não encaro como tal. O que encaro é que temos a necessidade de fomentar a cultura do nosso município. Então a gente encara isso como um programa de governo mesmo". "Se vai ter algum dividendo político, ou não, é consequência", completa.
Mestre em Cultura e Sociedade pela Universidade Federal da Bahia (UFBA) e especialista em Comunicação Política e Corporativa pela Universidade Salvador (Unifacs), o jornalista Celso Duran explica que os festejos juninos se inserem numa programática interessante para a construção da marca dos agentes públicos.
As postagens e outros posicionamentos podem ter um efeito contrário, pois não podem estar descolados de uma postura construída no decorrer da vida pública. “O Natal é uma data festiva que não é pontual. Falamos muito de reputação no marketing político, então é um momento de você, por exemplo, fortalecer um valor seu que ao longo da sua carreira política vem propagando. Hoje em dia o marketing é muito pautado na coerência. Não adianta ser incoerente, falar uma coisa e fazer outra coisa”.
De modo semelhante, a coerência na realização de festividades é algo a ser considerado no marketing. “Se você, no caso de um político, se propôs a não fazer uma série de eventos, mas propôs em sua plataforma ou como bandeira política o entretenimento, é coerente que você realize eventos, caso faça responsavelmente", adverte.
"A gente vive em um país que o entretenimento tem um peso muito grande, a cultura brasileira se volta muito para o entretenimento, o que é uma coisa bacana, mas, ao mesmo tempo, exige do gestor público a necessidade de ponderar”, alerta Duran.
Rayane Moreira, consultora em marketing político e eleitoral, analisa o comportamento estratégico que o Natal é uma data ideal para a consolidação de uma imagem. "Essa estratégia parte muito da humanização, porque é uma forma deles criarem conexão com o eleitor, que não vai votar em quem não conhece. Quando aproveitam o Natal ou essas festas de fim de ano, por exemplo, eles conseguem estreitar essa relação, criar conexão e empatia com esse eleitor", salienta.
Moreira enfatiza que, quando isso é levado para a internet, a tática acentua outra característica: a de influenciar na decisão das urnas no próximo ano: "Hoje as redes sociais têm um grande impacto na decisão de voto do eleitor. Então tem assuntos que têm uma atenção maior, como o Natal, ele pode ser aproveitado para produzir conteúdo para a internet".
Mestra em Ciência Política pela Universidade de Lisboa (ULisboa), ela pondera que o momento, aliado a outras iniciativas de proximidade durante o resto do ano, pode criar uma empatia e uma conexão do eleitorado.
"Se você cria esse canal de diálogo com o eleitor, não vai ser lá em agosto, quando é permitida a propaganda eleitoral, que você pedirá o voto, porque isso não se converterá em voto. O eleitor precisa, antes de tudo, conhecer os seus valores, criar empatia por você e uma emoção", completa a pesquisadora.
Diário do Nordeste
0 comentários:
Postar um comentário