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Erasmo Andrade Graduado de Direito |
No atual cenário político brasileiro, até o mais desavisado popular pode ser surpreendido divagando em seus pensamentos, onde uma real mistura de preocupação e insegurança com os rumos institucionais/políticos de nosso País vivem a consumi-lo. Antes de qualquer coisa, deixa-se claro que o artigo não possui a pretensão de ser parcial à tendência alguma, nem de acusação, nem muito menos de defesa, mas sim debater sobre “O DIREITO EM SÍ E/OU A FALTA DELE”. Sendo assim, logo de cara haverá aqueles que discordarão com a explanação textual, afinal de contas, dirão estes, “Isso é uma perda de tempo, não há o que se questionar, pois neste caso, os fins justificam os meios!”, mas será?
Um homem sábio certamente alertaria para o fato de que se quem com ferro fere, haveria sempre a possibilidade de ser com este mesmo ferro, ferido. Pois bem, seria interessante começar a nos questionar qual será o futuro que este país terá ao qual simplesmente ignorássemos nossas leis, ou passássemos a interpretar da forma que achássemos melhor, ao nosso bel prazer, com a desculpa de sempre buscarmos um “bem comum maior”. Nessa seara, o que impediria em um futuro próximo um fiscal, um guarda de trânsito, um juiz de primeira instância, enfim, uma autoridade qualquer, ao qual acredita piamente ter o direito de tomar decisões, as quais interfeririam diretamente em seu dia a dia, ou no seu plano de vida, sem uma justificativa plausível? Ou pior, e essa dita autoridade começasse a aplicar o entendimento de que você não tem direito a ter direito?
Não vamos aqui, entrar na meritocracia da relativização do princípio da dignidade humana , do certo ou do errado, culpado ou inocente, “afinal de contas em uma sociedade democrática, o correto é que os acusados pelo estado tenham um julgamento justo/imparcial com direito a ampla defesa, e que se for o caso, paguem pelos seus erros ao serem condenados”, mas a real intenção deste artigo é de se levantar o questionamento sobre até onde as ações do Juiz Sérgio Moro são discutíveis, e/ou até onde por analogia podem gerar uma interferência nos direitos e garantias constitucionais, se não legalmente, mas moralmente, pois em suas decisões tomadas, parece apoderar-se da espada da justiça em nome do combate à relativização do direito da dignidade da pessoa humana, onde existem leis e declarações, mas as quais não são seguidas, exercendo assim, o poder de decisão da justiça com o rigor da condenação pela força da lei.
O artigo 5º, inciso LVII da nossa constituição prevê que todo acusado pelo estado brasileiro é considerado inocente até ser declarado culpado e ao qual gozará da presunção de inocência até que se prove o contrário, ora compatriotas, ao divulgar à imprensa nacional a gravação de uma conversa da atual ocupante do Palácio do Planalto, com o seu antecessor, ressaltando que o referido grampo era referente aos números de Lula, vale lembrar que apesar das diversas suspeitas de atos ilícitos, até o momento, tais suspeitas ainda estão no campo da especulação, sendo portanto precipitado fazer quaisquer juízo de valor sobre a conduta dos dois, onde em uma analise prévia, é no mínimo uma falta de respeito com o nosso ordenamento jurídico já que o supracitado diálogo envolvia a Chefe do Estado Brasileiro e ao qual somente o Supremo possui competência para analisar os atos da presidência, isso para não explanar outras conjecturas, sendo assim, e diga-se de passagem, desnecessariamente, o nobre Juiz se depara com diversos embates sobre a sua possível imparcialidade e a nulidade de seus atos.
É de comum acordo que se trata de um descabimento a nomeação de Lula ao posto de Ministro da Casa Civil, mas como diriam os grandes juristas, “quem pode mais, pode menos”, então sendo assim, também são descabidas as ações que tratam como ilegal tal referida nomeação da senhora Dilma, já que no art. 84 , I, da Constituição Brasileira positiva que compete privativamente ao Presidente da República nomear e exonerar os Ministros de Estado.
Em um recente diálogo jurídico com um professor constitucionalista, o mesmo deu a entender que a finalidade de um ato político-administrativo deve também atender os requisitos dos atos administrativos, sendo assim, somente a competência originária da Presidente da República garantida pela Constituição Federal não seria suficiente para o ato de nomeação do ministro. Mas aí eis a questão, quantos ministros foram nomeados e exonerados sem se quer houvesse um questionamento sobre o tema?
Sob a alegativa do perigo de “obstrução à justiça” o Juiz Sérgio Moro demonstra seu ímpeto à frente da operação lava jato, mesmo gerando dubiedade sobre até onde vai a isonomia de suas decisões. Ressalta-se que tal suspeita necessita de provas e aos acusados reserva o direito de se defender perante à acusação, além do mais, a grosso modo entendemos que “obstrução à Justiça” é uma situação na qual o agente, de má-fé e com intenção, gera empecilhos ao movimento da Justiça para coibir o cumprimento de uma ação judicial ou policial. O ato de nomeação de uma determinada pessoa como ministro, levando-o a ser apreciado pelo Supremo Tribunal Federal, seria tratar a corte como um apenso à Justiça, ou seja, como se não fizesse parte da mesma.
Seria cômico, se nossa situação não fosse trágica ao ver como nós brasileiros sempre buscarmos um “salvador da pátria”, alguém que se destaque e resolva nossas agruras, enfrentando a tudo e a todos sem distinção. Sendo assim, as ações do Juiz paranaense Sergio Moro encaixa-se com perfeição no pedestal de herói de uma nação carente por ídolos, onde chega-se a relevar o fato de ser humano. Não que Moro tenha procurado tirar proveito desta situação, muito pelo contrario, o mesmo vem se mostrando avesso a qualquer tipo de publicidade quando se trata de sua pessoa. Mas até onde pode ser prejudicial uma relação onde um funcionário publico é tratado como um herói nacional somente por estar desempenhando o papel para o qual foi talhado a exercer, até onde pode afetar seu discernimento dos fatos?
O atual sistema constitucional brasileiro não considera o direito à privacidade como totalmente absoluto. Porém, o direito ás vezes não abraça a política, e sendo assim, as referidas ações ultrapassaram todos os limites do bom senso moral e legal. Em um primeiro momento, até mesmo para evitar questionamentos desnecessários, o juiz Sergio Moro deveria ter se resignado quanto a divulgação seletiva de certos trechos da investigação relacionados à Lula; em segundo, deveria ter prontamente enviado o conteúdo dos diálogos em que aparecem o ex e a atual presidente da república ao Supremo Tribunal Federal; em terceiro, jamais sob nenhuma alegação deveria ter permitido a divulgação dos diálogos de Lula, enquanto cliente, e seu advogado Luiz Carlos Sigmaringa Seixas, mitigando assim a garantia constitucional do sigilo entre cliente e advogado positivado na Constituição Brasileira, e por fim, mas não menos importante, deveria ter impedido que as interceptações da Policia Federal continuassem após ele mesmo ter decretado o fim das gravações.
Afinal de contas, em um Estado democrático sério jamais se justificaria o desrespeito à inviolabilidade da comunicação entre cliente e advogado, independente de que crime se esteja apurando ou quem quer que seja o cliente. Agora imaginem gravar e expor na imprensa? Ao divulgar os diálogos de Lula com seus advogados, abriu-se um perigoso precedente para simplesmente ignorar todas as garantias constitucionais previstas no ordenamento jurídico brasileiro, ao passo que o artigo 5º, em seus incisos XIII garante que é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer; já o XIV positiva que é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional”.
É apropriado enfatizar que o tema sobre a quebra da garantia constitucional do sigilo entre advogado/cliente é prevista na área penal através do o artigo 154 do Código Penal Brasileiro onde é claro ao prever o crime de violação do segredo profissional à todo aquele que “Revelar a alguém, sem justa causa, segredo, de quem tem ciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja revelação possa produzir dano a outrem”. E através do artigo 207 do Código de Processo Penal onde se pronuncia sobre a proteção ao sigilo profissional ao prever que “ são proibidas de depor as pessoas que, em razão de função, ministério, ofício ou profissão, devam guardar segredo, salvo se, desobrigadas pelas parte interessada, quiser dar seu testemunho”.
Então, mesmo após apresentar questionamentos sobre todas as indagações pertinentes ao assunto, é de senso comum que o sentimento de insegurança institucional/política permanece. Será mesmo que os fins justificam os meios? Se o anseio popular é a demonstração de que ninguém esta acima da lei, este é o momento de demonstrarmos que a política dos dois pesos, duas medidas não se aplica mais em terras tupiniquins.
Erasmo Andrade
Graduando em Direito (Unifor)